O centenário do escritor Jorge Leal Amado de Faria (1912-2001) é
comemorado em 2012. Além
disso, por ser modernista, retratar a diversidade das problemáticas
brasileiras, é possível que sua vasta e rica obra seja tema do ENEM. Diante da
diversidade de suas produções, a indicação vai para Capitães da Areia, livro que
aborda a dimensão social e política dos meninos e meninas “de rua” (década de
30). Assim, a contextualização da problemática referente aos meninos e meninas
“de rua” e suas implicações teóricas, sociais e políticas poderá ser um aspecto
contemplado.
No debate atual, será possível uma reflexão sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/93, que
reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos.
Dica da disciplina de
Sociologia – Profa. Marilene Banhos
Leitura e Cidadania
ATA DE INCINERAÇÃO
Aos dezenove dias do mês de novembro de 1937, em frente à Escola de
Aprendizes Marinheiros, nesta cidade do Salvador e em presença dos senhores
membros da comissão de buscas e apreensões de livros, nomeada por ofício número
seis, da então Comissão Executora do Estado de Guerra, composta dos senhores
capitão do Exército Luís Liguori Teixeira, segundo-tenente intendente naval
Hélcio Auler e Carlos Leal de Sá Pereira, da Polícia do Estado, foram
incinerados, por determinação verbal do sr. coronel Antônio Fernandes Dantas,
comandante da Sexta Região Militar, os livros apreendidos e julgados como
simpatizantes do credo comunista, a saber: 808 exemplares de Capitães
da areia, 223 exemplares de Mar morto, 89 exemplares de Cacau, 93
exemplares de Suor, 267 exemplares de Jubiabá, 214 exemplares de País do
carnaval, 15 exemplares de Doidinho, 26 exemplares de Pureza, 13 exemplares de
Bangüê, 4 exemplares de Moleque Ricardo, 14 exemplares de Menino de Engenho, 23
exemplares de Educação para a democracia, 6 exemplares de Ídolos tombados, 2
exemplares de Idéias, homens e fatos, 25 exemplares de Dr. Geraldo, 4
exemplares de Nacional socialismo germano, 1 exemplar de Miséria através da
polícia.
Tendo a referida ordem verbal sido transmitida a esta Comissão pelo sr.
Capitão de Corveta Garcia D'Ávila Pires de Carvalho e Albuquerque e a
incineração sido assistida pelo referido oficial, assim se declara para os
devidos fins.
Os livros incinerados foram apreendidos nas livrarias Editora Baiana,
Catilina e Souza e se achavam em perfeito estado.
Por nada mais haver, lavra-se o presente termo, que vai por todos os
membros da Comissão assinado, e, por mim segundo tenente intendente naval
Hélcio Auler, que, servindo de escrivão, datilografei. (assinados)
Luís Liguori
Teixeira, Cap. Presidente
Hélcio Auler, Segundo-Tenente Int. N.
Carlos Leal de Souza Pereira
Hélcio Auler, Segundo-Tenente Int. N.
Carlos Leal de Souza Pereira
Transcrito do jornal
Estado da Bahia, de 17-12-37
Há pouco mais de 60 anos, surgia na literatura brasileira um livro
marcado pelo estigma da incineração pública. Censurado e perseguido no momento
de seu lançamento, Capitães da areia, de Jorge Amado, aparece às vésperas da
decretação do Estado Novo, em 10 de novembro de 1937. (...)
(...) Capitães da areia. O romance dos meninos de rua recupera o ímpeto
romanesco e heroificador dos humildes adotado desde Cacau. Os pequenos bandidos
chefiados por Pedro Bala surgem acima de tudo como vítimas de uma sociedade
opressora e hipócrita. A violência que praticam é inscrita no texto quase
sempre como justa e, mesmo, necessária - uma resposta à violência econômica
sofrida pelos de baixo e transformada em agressão sádica quando praticada pelo
aparelho repressivo. O romance toma o partido dos, já àquela altura,
considerados menores, mas para fazê-los maiores. Eles se engrandecem
no drama do Sem Pernas, que prefere o suicídio ao reformatório; no
arrependimento culpado de Pedro Bala, quando se coloca no lugar de sua vítima;
e, como não poderia deixar de ser, no momento em que o grupo retifica sua
prática e avança rumo às lutas sindicais e políticas. (...)
Apesar da elevação e, mesmo, da heroificação - próprias ao modo
romanesco - com que trabalha a representação dos pequenos bandidos, o texto
amadiano não deixa de tratá-los como problema. Os meninos crescem, mas o
problema do qual fazem parte persiste. A desigualdade que gera os menores
infratores é a mesma que produz o cangaceiro (Volta Seca) e o marginal urbano
(Gato); é a mesma que propicia o surgimento do artista engajado (Professor) e
do ativista político (Pedro Bala). Ao final, os meninos tomam corpo de adultos,
mas continua a tensão que os opõe ao mundo e que exige deles novas armas. Amado
faz da desigualdade não apenas o núcleo, a enervação central do romance. Ao
mimetizá-la, quer falar a história do outro, a história a contrapelo, centrada
nas vozes subalternizadas. E, ao trazer essas vozes para o centro do projeto
socialista que embala seus primeiros escritos, quer construir, pela via
literária, a solução. Apontando aos marginais o caminho da luta de classes, em
pleno alvorecer do Estado Novo, Jorge Amado ostentava, provocativamente, o lado
subversivo da utopia. (...)
Os meninos passaram de "dominados" a "excluídos"
(...)
Eduardo de Assis
Duarte - Professor da Faculdade de Letras da UFMG, doutor em Teoria da
Literatura e Literatura Comparada pela USP.
Texto na íntegra em: http://www.unicamp.br/iel/memoria/Ensaios/leitura%20e%20cidadania.htm
“Capitães da Areia”, a narrativa pela ótica de meninos de rua
Não há violência maior do que o abandono. E é
justamente essa violência que Jorge Amado explora e coloca sob a ótica da
vítima em “Capitães da Areia”. Na obra, de 1937, os heróis são os meninos de
rua. “Pela primeira vez na literatura brasileira, o menor abandonado é o centro
da história. Hoje ele é motivo de preocupação, mas há 73 anos era confundido
com deliquente e a discriminação era grande”, afirma Eduardo de Assis Duarte,
professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisador da obra
de Jorge Amado.
Duarte destaca que “Capitães da Areia” não tem grande importância
estética, formal, e sim política. “Jorge Amado usa a forma de romance
tradicional, ele se apega à herança romântica do século 19. Não é um livro de
vanguarda modernista. A importância da obra é de natureza política. Trata-se de
um livro politicamente revolucionário para a época”, afirma o professor e autor
da tese de doutorado “Jorge Amado: Romance em tempo de utopia”.
“Capitães da Areia” foi censurado, e Jorge Amado preso pela polícia do
Estado Novo (1937-45), regime de exceção instituído por Getúlio Vargas que
limitava a liberdade política. Mais de mil exemplares de livros foram queimados
em uma grande fogueira em praça pública em Salvador.
“Na época, o livro foi um escândalo. Além da questão do erotismo, o
ponto de vista das crianças ladras não era aceito. Jorge tem um olhar humano e
as transforma em figuras humanas e não em monstros. O autor não defende o
roubo, mas ele mostra porque as crianças agem assim. Elas roubam porque têm
fome, porque não têm pai e mãe”, elenca Duarte.
Por Marina Morena Costa, iG São Paulo
Texto na íntegra em:
Relator: redução da maioridade penal fere princípio constitucional
O deputado Luiz Couto (PT-PB) afirmou nesta quarta-feira (6), em
bate-papo com internautas realizado pela Agência Câmara, que a Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16
anos, contraria artigo da Constituição que não pode ser alterado (cláusula
pétrea), além de desrespeitar o Pacto de São José da Costa Rica, do qual
o Brasil é signatário. Segundo esse tratado, os adolescentes devem ser
processados separadamente dos adultos.
“A redução da maioridade penal fere o artigo 60, parágrafo 4º, inciso 4º
da Constituição. Contraria diretamente o princípio da dignidade da pessoa
humana”, defendeu Couto, que é relator na Comissão de Constituição e Justiça e
de Cidadania (CCJ) da PEC171/93 e de outras 29 PECs apensadas a ela
que autorizam o julgamento de adolescentes como adultos.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ressaltou
ainda o deputado, os adolescentes vivem uma fase especial do desenvolvimento
humano e por isso o Estado tem o dever de lhes assegurar proteção integral.
Para ele, reduzir a maioridade penal seria o mesmo que jogar os jovens em
conflito com a lei no deteriorado sistema prisional brasileiro, considerado por
muitos com uma “universidade do crime”. (...)
Perguntado sobre a falta de qualidade dos locais onde os adolescentes
cumprem medidas socioeducativas, o deputado afirmou que eles ainda precisam
aumentar em quantidade e qualidade. “A violência vinda de adolescentes existe,
mas é preciso aumentar o número de instituições que de fato os recuperem. Não podemos
simplesmente colocá-los em centros que são verdadeiras cadeias, que transformam
os jovens em bandidos muito mais perigosos”, argumentou.
Couto disse que a família também deve se responsabilizar por uma criação
que leve a criança a valorizar uma cultura de paz. “É preciso que a família, a
comunidade, a sociedade em geral e o Poder Público assegurem proteção e socorro
em quaisquer circunstâncias. Se temos adolescentes em conflito com a lei, a
culpa não é só do Estado, ela é de todos nós. A sociedade também precisa se
mobilizar”, sustentou o relator.
Ver na íntegra em:
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